Valeu Tudo – Remix da Festa Pobre
Não me convidaram pra essa festa pobre. Mas eu fui mesmo assim. Cheguei atrasada, como sempre, achando que ia ter ao menos um salgado frio e uma ilusão quente. Que nada. Nem um cigarro me ofereceram. Fiquei foi na porta, estacionando os carros e sorrindo como quem ainda acreditava na meritocracia.
VALE TUDO
Lisdeili Nobre
3/30/20253 min read


Não me convidaram pra essa festa pobre. Mas eu fui mesmo assim. Cheguei atrasada, como sempre, achando que ia ter ao menos um salgado frio e uma ilusão quente. Que nada. Nem um cigarro me ofereceram. Fiquei foi na porta, estacionando os carros e sorrindo como quem ainda acreditava na meritocracia.
O problema é que essa festa já tava armada antes de eu nascer. Uma droga de festa, diga-se de passagem. Mal decorada, mal intencionada e cheia de gente bem vestida de mentira.
E o Brasil? Ah, o Brasil… Mostra tua cara! Mas não vale usar filtro, nem Photoshop político. Quero ver quem paga essa conta pra gente viver assim, sambando no asfalto quente das promessas rasgadas.
No remix de 2025, o “Vale Tudo” virou “Qual é o seu valeu tudo?”, com direito a trilha sonora de hipocrisia remixada em beat acelerado. Por dinheiro e poder, tem gente capaz de trair amigo, parceiro, cachorro e até a própria sombra. Amizades são descartadas como peças de xadrez – e nem é aquele xadrez elegante, é aquele joguinho de celular com propaganda no meio.
Tem gente que mente descaradamente. Currículo turbinado, passado e presente inventado, promessas genéricas tipo “em breve, novidades”. Vão longe. São os empreendedores da própria imagem: vendem sucesso e entregam enganação.
E o jogo político? Virou campeonato de incoerência. Não existe mais adversário, só aliado temporário. Um dia crítico, no outro bajula – tudo por um carguinho, uma emendinha, um cafezinho no gabinete alheio.
Explorar trabalhador virou hobby de quem acha que pagar mal é “formar caráter”. Cobram produtividade como se estivessem salvando o mundo, mas não pagam nem a hora extra. E ainda falam com orgulho: “aqui a gente veste a camisa”. Pois é, a camisa vem sem vale-transporte e com dívida no CPF.
E olha... no Vale Tudo 2025 tem de tudo mesmo.
Tem gente participando de esquema de corrupção como se fosse jogo do bicho – naturalizado, rotineiro, tradicional.
Tem quem se associe com criminoso, porque “parceria é negócio”.
E se você estiver no caminho, sinto muito: vai ser atropelado com tapinha nas costas e emoji de foguinho no story.
Espalhar fake news virou arte. Manipular a opinião pública virou estratégia. Fritar a oposição virou meta de engajamento. E se reclamar, dizem que é mimimi. Mas é só mais uma fritura no Werfray do dia.
Agora, assumir persona falsa nas redes sociais é quase regra. Influencer da vida perfeita, filtro de ostentação, legenda de gratidão, mas na real o boleto está vencido. Tá valendo. O importante é parecer rico, poderoso e requisitado.
E o ativismo?
Nossa, nunca vi tanto ativista de tela! Gente que posta uma frase pronta e acha que mudou o mundo. Fingem causas sociais, levantam bandeiras que combinam com o feed. Curtida virou consciência.
Subornar autoridade é tão natural quanto furar fila de balada. “Quem tem dinheiro não espera” – e ainda faz vídeo rindo da cara de quem respeita a regra.
E olha a cara de pau: tem gente inventando doença ou tragédia só pra ganhar pix, like ou vaquinha. Nem a dor alheia escapa do vale-tudo da autopromoção.
E pra parecer mais confiável?
Usam a fé como fantasia. Casca de pai de família, discurso de Deus no controle e, por dentro, a planilha da próxima fraude e do ato de violência doméstica.
No vale-tudo da preguiça e da inveja, plagiam ideias, roubam projetos, copiam até as vírgulas – e ainda postam como se fossem gênios da criação. Ah, quando ganham espaço, dizem que sempre apoiaram. Memória seletiva é o novo talento.
Manipular imprensa ou mídia local virou prática. Compram manchete, editam verdade, apagam passado. E se a matéria incomodar, é só chamar de “inimigo da gestão”.
E sim, vale ameaçar. Veladamente ou não. Quem ousa se posicionar, vira alvo. O ódio virou argumento, a violência é usada com emoji.
O amor já é negócio desde que a humanidade existe: casar por interesse é o “match” mais antigo. Amor mesmo? Só se vier com patrimônio.
E o voto?
Ah, o voto... vendem fácil, fácil, fácil. Por cargo, por cesta, por promessa de emprego que nunca chega. E depois, a conta vem. A conta do mal serviço, do desperdício, do futuro dissolvido. E quem paga? Todo mundo. Até quem nunca foi convidado pra festa.
Hoje, usar o sofrimento alheio pra se promover é trend certa. Post com criança, mulher violentada, racismo, legenda emocionada, link pra doação e... pronto. Like garantido. Mas só até a próxima moda da dor.
Mas o que é pior: tem quem silencie diante da injustiça. “Não é conveniente se posicionar agora”. Traduzindo: “deixa como está, não quero perder seguidor nem contrato”.
É isso. Grande pátria desimportante, onde a dignidade ficou na fila que ninguém quis pegar.
Mas uma coisa eu digo, Brasil:
Não vou te trair.
Eu vou continuar falando, mesmo que seja da porta, mesmo que não me convidem, mesmo que eu só esteja estacionando os carros dessa festa pobre. Porque no fim das contas, alguém tem que contar essa história. Nem que seja num post, num verso, ou numa crônica remixada.